Coluna: Silvio Santos, Sheherazade e o jornalismo “do bem”
Não é de hoje que Silvio Santos admite em público que não gosta de jornalismo na TV, principalmente em sua emissora, o SBT. Mantém telejornais diários, unicamente porque toda emissora aberta tem que cumprir uma cota diária de 5% de informação. Mesmo assim, o canal foi divisor de águas no telejornalismo, criando conceitos como o “Aqui Agora” e o “TJ Brasil”.
E se ainda alguém se admira quando o Patrão decide acabar com três horas de jornalismo ao vivo para exibir no lugar 3h de desenho animado, certamente é porque não conhece os gostos do grande apresentador, que como diretor de emissora, nunca foi um bom estrategista, principalmente por mexer na grade, conforme seu estado de humor.
No dia 3 de março de 1988, Silvio Santos escreveu os Princípios Editoriais do Jornalismo do SBT. O texto, direcionado aos funcionários da emissora deixa claro como os jornalistas da casa devem se portar: “O tom do Jornalismo deve ser otimista, procurando mostrar que, mesmo nas situações mais trágicas, é possível dar a volta por cima”.

Em pronunciamento, também em março de 88, Silvio Santos disse que “jornalista que quer trabalhar no SBT não pode ser investigador, porque quem tem que investigar é a polícia. Na minha estação de televisão ele só tem que dar a notícia e encontrar as qualidades da pessoa”.
Certamente estes não são os princípios ensinados nas faculdades de Jornalismo. Não é a toa que após anos sem investir em jornalismo, o empresário resolveu dar uma oportunidade as ex-Casa dos Artistas, Analice Nicolau e Cíntia Benini, no “SBT Notícias Breves”, jornal que ficou conhecido na época pelo jogo das pernas das apresentadoras.

Silvio Santos, muitas vezes se contradiz como empresário, como quando contratou a jornalista Rachel Sheherazade, da afiliada paraibana, após criticar o Carnaval. Bancou sua vinda para São Paulo e lançou um novo “SBT Brasil”, com direito aos comentários de Rachel, no principal telejornal. Mas foi só a apresentadora falar demais e comprometer a relação política de Silvio Santos com o governo federal que Rachel ganhou uma mordaça e foi proibida de omitir opiniões e recentemente até de demonstrar expressões faciais no ar. Outra exceção ocorreu com Boris Casoy, quando ele estreou o “TJ Brasil”, sendo o primeiro âncora comentarista do telejornalismo brasileiro. Atualmente, Roberto Cabrini e seu premiado “Conexão Repórter”, também seguem uma exceção nos olhos de Silvio Santos. Mesmo que Cabrini atue no jornalismo investigativo, Silvio mudou seu programa para os domingos com a saída de Marília Gabriela e vem alcançando desde sua reestreia, momentos de liderança.
Com o fim do “Notícias da Manhã”, atualmente, o SBT mantém no ar o “SBT Brasil”, as 19h45, e o Jornal do SBT, após o “The Noite”. Este último tem duas reprises as 04h e as 05h da manhã, apenas para São Paulo. Mesmo com boletins em todos os comerciais, anunciando reportagens que serão destacadas nos seus telejornais, o SBT chega a ficar 14h diárias sem um telejornal. Difícil dar credibilidade assim. Num Troféu Imprensa recente, o próprio Silvio Santos disse que o futuro da TV seria a teledramaturgia e o jornalismo. Por economia, ou por mágoa, Silvio esqueceu o segundo dos pilares. O dono do SBT, desde os tempos que começou no rádio e depois comprava espaço na TV, sempre foi bastante atacado pela imprensa. Quando conseguiu o SBT, se sentiu ainda mais acuado pelos meios de comunicação da época e quis inserir seu DNA de entretenimento na sua empresa. O jornalismo, infelizmente foi deixado em segundo plano, sempre é claro, com algumas raras exceções.
Júlio César Fantin
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