Coluna: Nossa “santa” televisão de cada dia

Coluna: Nossa “santa” televisão de cada dia

souTelespectador

Vivemos uma época onde nossa televisão aberta brasileira nunca esteve tão “politicamente correta”, jamais nesses quase 65 anos de existência a nossa TV se apresenta tão careta como agora. Cenas cortadas em novelas, Banheira do Gugu sendo vetada, costumes da televisão alterados para não chocar a “família” brasileira. Nem o comercial de uma marca famosa de perfumes escapou da censura cruel e infundada da sociedade contemporânea.

Desde o surgimento da televisão no Brasil até o fim do ano de 1988 a censura foi uma verdadeira dor de cabeça para os diretores de TV no país. Todos os programas apresentados, incluindo telejornais, deveriam passar por uma análise de conteúdo para depois serem apresentados com a devida classificação etária. A censura não admitia críticas ao governo (época da Ditadura Militar), muito menos assuntos que ferissem a moral e os bons costumes da sociedade brasileira. Caso essas novas não fossem obedecidas à emissora poderia ser suspensa (ficaria dias fora do ar) ou até mesmo cassada (perderia a concessão).

Foi um tempo bastante difícil para produtores de TV, muitas notícias deixaram de ser divulgadas ou foram simplesmente torcidas, enredos de novelas alterados e programas de auditório vivendo sob pressão. Um fato emblemático foi o veto da novela “Roque Santeiro” em 1975 pela Ditadura Militar no dia de sua estreia. Com vários capítulos gravados, a trama de Dias Gomes foi cancelada com a desculpa de ser uma ofensa à moral, à ordem pública e um achincalhe à Igreja. Em seu lugar a Rede Globo foi obrigada a exibir uma reprise da novela “Selva de Pedra” de Janete Clair enquanto produzia uma nova trama. “Roque Santeiro” foi exibida em 1985 totalmente regravada sendo uma das melhores novelas exibidas pela emissora carioca nesses 50 anos.

O fim da censura veio com a constituição de 1988, vários programas começaram a ousar cada vez mais e autores de novelas tiveram total liberdade para criar. Mesmo com uma sociedade conservadora, o telespectador brasileiro sempre teve sede por conteúdos ousados na televisão. Nessa época as pessoas viram isso com mais naturalidade, pois como os conteúdos eram monitorados pela censura seria natural essa nova “linguagem” ser adotada pelas emissoras.

A Globo começou a apimentar suas aberturas de novelas com mais frequência, tramas como Tieta (Isadora Ribeiro), Pedra Sobre Pedra (Mônica Fraga) e Mulheres de Areia (Mônica Carvalho) apresentavam mulheres nuas em suas aberturas. A extinta Rede Manchete também apostou na ideia apesentando Nani Venâncio como veio ao mundo na abertura de “Pantanal”. Todas elas ficaram bastante famosas com os respectivos trabalhos e se tornaram atrizes famosas posteriormente.

A novela “Mulheres de Areia” foi a novela de maior audiência dos anos 90 no horário das 18 horas, sua abertura com Mônica Carvalho tomando banho de mar completamente nua foi  muito elogiada, apesar do horário, pela maioria dos telespectadores. Em 1996 a trama de Ivani Ribeiro chegou a ser reprisada durante a tarde na sessão “Vale a Pena Ver de Novo”, sua abertura se manteve inalterada a mesma de 1993, fato esse que não ocorreu em sua segunda reprise. No ano de 2011 para comemorar os 60 anos da teledramaturgia brasileira um fato curioso aconteceu: Sua abertura foi totalmente descaracterizada, tudo para esconder a nudez de Mônica Carvalho. Segundo a Rede Globo, a abertura não era compatível com os padrões morais atuais do país.

Semana Passada, Gugu Liberato e sua produção resolveram homenagear o quadro de muito sucesso nos anos 90 “Banheira do Gugu”. Esse “revival” foi frustrante. A expectativa de todos era para que pudéssemos assistir uma “banheira” no mínimo igual aquela que assistíamos nas tarde de domingo. Na época eu era criança e não via com maus olhos aquele pega-pega dentro d’água, afinal de contas os tempos eram outros… Na Record a “Banheira do Gugu” recebeu o apelido de “banheira gospel” devido à forma “comportada” como os convidados se apresentaram. Quem iria imaginar que a “Prova da Banheira” exibida nas tarde de domingo com mulheres quase nuas seria homenageada às 23 horas com mulheres de shorts grandes? Seria cômico se não fosse trágico! Quem esperou o circo pegar fogo foi dormir como eu: decepcionado!

No último domingo, dia 31 de maio, Gilberto Braga concedeu uma entrevista corajosa e polêmica ao jornal O Globo. Braga chamou as pessoas de hipócritas ao ser interrogado se elas não gostavam de assistir cenas de sexo na TV. Como sabemos a novela “Babilônia” é o maior fiasco global em seus 50 anos.  A trama iniciou com muitas cenas quentes e com um beijo de duas estrelas da dramaturgia, Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, sobre isso ele disse que a cena foi mais demorada do que se foi programado e o fato de serem  duas grandes atrizes ganhou mais burburinho. Lógico que as declarações de Gilberto ao Jornal O Globo não justificam, Babilônia é um fracasso porque não apresenta uma boa historia que encante o telespectador. Talvez seja esse o grande erro da Globo atualmente, preferem apostar em temas polêmicos em suas novelas do que desenvolver um enredo motivador e bem amarrado que prenda e emocione o grande público. Como podemos recordar muitas das novelas de sucesso da extinta Rede Manchete prendiam o público com cenas quentes incluindo mulheres nuas e muito sexo entre os personagens, porém atreladas a ótimas histórias, o que não vem ocorrendo nas novelas globais.

Não bastasse a censura ácida da Ditadura Militar que afligiu nossa televisão em passado não tão distante, vivemos hoje uma repressão velada da nossa sociedade que não admite ser retratada na televisão a verdadeira situação do cotidiano atual. Alguns pais esperam que professores, vizinhos ou até programas de TV eduquem seus filhos, a vida agitada e cada vez mais difícil os obrigam a isso. Muitos não conversam com seus filhos sobre a realidade da vida e preferem culpar a televisão pelos devaneios do mundo. Preferem tampar o sol com a peneira… Bom exemplo deve começar em casa! Vivemos uma sociedade falso – moralista e antiquadra, assistindo uma televisão cada vez mais careta. Sobrou até para uma campanha publicitaria de uma famosa marca de perfumes… A que pontos chegamos!

Coluna Sou Telespectador

Siga-me no Twitter: @soutelespectado

Curta nossa página no Facebook: www.facebook.com/soutelespectador

Compartilhar: