“Ditadura religiosa”? Igrejas arrendam e compram a maioria dos canais de TV aberta em São Paulo – Realidade é a mesma no restante do país

Um verdadeiro absurdo ocorre diante dos olhos do Ministério das Comunicações e do Ministério Público Federal, na Grande SP, bem como, na maioria das principais cidades do Brasil. Se não bastassem os horários comprados nas principais emissoras de TV, ocupando grande parte de suas programações, as igrejas passaram a comprar ou arrendar toda a programação de importantes canais da TV aberta, deixando o telespectador praticamente sem opções.
Com exceção de SBT e Globo, na Grande SP, todas as demais emissoras vendem seus horários diariamente para igrejas evangélicas. E se isso já não fosse mais do que o suficiente, muitas emissoras com conteúdo variado foram vendidas ou totalmente arrendadas para transmitirem sessões de descarrego, autoajuda e cultos, 24h por dia, sem qualquer “censura ou classificação indicativa”. Tudo em nome da liberdade religiosa, outrora, sem o mínimo de bom senso, num completo cenário que aparenta uma “overdose religiosa”.

Num país que ao mesmo tempo tem toda crença religiosa garantida por lei, utilizar concessões públicas de um “Estado Laico”, tirando a pluralidade de conteúdo dos canais abertos, ultrapassa os limites do exagero e da própria legislação, até mesmo porque, uma concessionária de empresa de comunicação não pode vender horários a terceiros e deve restringir até no máximo 25% da sua programação em publicidade. A cota de 5% também deve ser respeitada para a produção de conteúdo jornalístico, o que também não é respeitado por alguns canais. Chegar aos fiéis, através do telespectador que se vê cercado em todos os canais possíveis por uma espécie de “ditadura religiosa”, não parece ser a forma mais democrática, ainda mais que o nosso país isenta as igrejas de impostos, gerando assim grande poderio econômico desleal, o que atrai os concessionários e quase a totalidade do mercado de radiodifusão, simplesmente pela comodidade e facilidade em ter lucro com um dinheiro abundante que ‘cai dos céus”.
Na capital paulista é possível sintonizar até 48 canais na TV aberta, hoje em operação. Entre as opções estão SBT (sem programas religiosos), Globo (com transmissão semanal da missa do Padre Marcelo Rossi), RecordTV (com programação da Igreja Universal nas madrugadas – com 4h45 durante a semana e até 7h45 de programação religiosa aos domingos), Band (com 4h diárias de Igrejas), RedeTV! (com 11h30 diárias vendidas para as Igrejas), Gazeta (com igrejas e produções independentes), Record News (com a Igreja Universal em horários alternativos), Terra Viva, NGT e Esporte Interativo. Já a Rede Brasil de Televisão, que opera em duas concessões de canais na cidade de São Paulo, tem produção própria, mas também comercializa grande parte da grade para infomerciais e igrejas.
E quando o tema é religião, hoje as opções são a maioria. Mais de 15 canais, totalmente focados em ideologias religiosas, apenas em São Paulo. Em outras praças, se vê uma diversidade de programação ainda inferior, em virtude do número reduzido de canais. A Rede Vida (presente em todas as capitais e 1500 cidades) e a TV Aparecida (25 capitais), são as principais emissoras voltadas ao público católico. A TV Ideal (antiga MTV), hoje passou a transmitir em sua totalidade a TV Universal (da IURD – bispo Edir Macedo), que já está presente nas principais cidades do país. A CNT que já chegou a ser uma rede de médio porte, hoje transmite mais de 22h diárias da programação da Igreja Universal que também alugou em sua totalidade a Rede 21, do Grupo Bandeirantes. A “evangelização” continua com a Boa Vontade TV, TV Novo Tempo, TV Século 21, TV Canção Nova, Boas Novas, RIT TV – em duas concessões (da Igreja Internacional da Graça – missionário RR Soares), Rede Gospel, TV Mundial (do pastor Valdemiro Santiago) e TV Plenitude.
Por fim, na capital paulista, há também os canais públicos: TV Brasil, TV Cultura, Multicultura, Univesp, NBR, TV Escola, Canal Saúde, TV Justiça, Ponto Jus, TV Câmara, TV Assembléia SP, TV Senado e TV Câmara SP. Como a legislação não permite, pelo menos até então, os canais ligados aos órgãos públicos, hoje são as fortalezas que ainda separam o telespectador, do “Império do dízimo”. E se o telespectador, com condições financeiras favoráveis, resolver fugir para a TV por assinatura, existem diversos canais alternativos, mas nem por lá, ele estará livre de uma infinidade de canais que exploram a fé do brasileiro. Tudo isso está muito longe de acabar, pois enquanto os órgãos responsáveis fazem “vista grossa”, emissoras de rádio e televisão, cada vez mais se rendem ao “capitalismo selvagem” da “indústria dos servos divinos”.
Siga: JÚLIO CÉSAR FANTIN
Twitter: @jcfantin
Facebook: @eusouojulio
Instagram: @juliocesarfantin
