Em 2001, Globo contou com reforço “vindo do céu” para manter os bons índices na faixa das sete

Em 2001, Globo contou com reforço “vindo do céu” para manter os bons índices na faixa das sete
João Medeiros (Tarcísio Meira) era o protagonista da trama das sete. Foto: Divulgação

“O milagre é uma das coisas que mais emocionam o ser humano, não importa que nossa época seja tão descrente dele “, disse Antonio Calmon o autor de “Um Anjo Caiu do Céu”, novela das sete da Rede Globo que estreava há exatos 19 anos com a missão de manter os bons índices da faixa.

Não é exagero, a imprensa da época chegou mesmo a afirmar que “Um Anjo Caiu do Céu” chegava para desmitificar a máxima de que o horário das 19h nunca era ocupado duas vezes seguidas por uma novela de sucesso. E esse “mito” em torno da novela daquela faixa era fruto dos resultados obtidos por algumas antecessoras de “Uga Uga” (que repercutia muito bem naquele ano). Assim, a expectativa era de que a sucessora da trama de Carlos Lombardi elevasse ou, ao menos, mantivesse os bons números.

Em junho de 2000, jornais e revistas já traziam informações iniciais sobre a trama. A primeira delas, dava como certa a estreia em 20 de novembro daquele ano. Entretanto, “Um Anjo Caiu do Céu” só estreou em 22 de janeiro de 2001, levando sua antecessora, “Uga Uga” a fechar com 221 capítulos.

E as expectativas geradas não foram em vão, naquele 22 de janeiro de 2001, a novela, estreou com 39 pontos de média no Ibope (números da Grande São Paulo), quase 3,2 milhões telespectadores, naquele ano.

 

Produção

 “Um Anjo Caiu do Céu” começou a ser produzida com um orçamento de aproximadamente R$ 120 mil por capítulo, o que possibilitou certa ousadia na produção da trama.

As gravações estavam previstas para agosto de 2000, em algum lugar da Alemanha, Rússia ou Canadá, países frios e com neve, já que, segundo o diretor Dennis Carvalho, a intenção era exibir cenas de luta naquelas condições climáticas. Entretanto, o cenário mudou e a República Tcheca foi o país escolhido para a estreia de “Um Anjo Caiu do Céu”. Logo, o horário das sete foi inundado por imagens da belíssima Praga, capital daquele país.

E por falar em diretor, é preciso mencionar que Dennis Carvalho foi para o comando da produção antes mesmo da estreia da novela das seis daquela época, O Cravo e a Rosa, que fazia parte do seu núcleo. Coube a Dennis apenas realizar a conceituação da novela de época, após isso, deixou a direção-geral nas mãos de Walter Avancini e Amora Mautner.

Dennis Carvalho contou em entrevista, às vésperas da estreia, que estava apostando alto em “Um Anjo Caiu do Céu”.

“A minha intuição para esta novela está muito parecida com a que tive em 1988, com a novela Vale Tudo, do Gilberto Braga, que foi meu maior sucesso”, contou em entrevista antes da estreia.

À imprensa da época, Antonio Calmon, que assinava a autoria da novela, falou sobre suas referências para a sinopse  de “Um Anjo Caiu do Céu”. O autor de hits como Vamp, Corpo Dourado e Cara & Coroa contou que buscou inspiração nos filmes do diretor Frank Capra.

“Procurei nele o espírito de seus filmes para a família toda, ou seja, o que se espera de uma novela das 19h. Isto implica misturar fatos da vida com fantasia, drama com comédia, visão crítica com emoção.”

Antonio Calmon, autor de vários sucesso da faixa das sete, na Globo. Foto: Memória Globo

Ainda sobre as fontes de inspiração para conceituar “Um Anjo Caiu do Céu”, o autor disse que “A felicidade não se compra” (1946) era o que mais tinha a ver com sua narrativa que estava para estrear no horário das 19h. Na história, um anjo gordinho salva James Stewart do suicídio e mostra-lhe o que seria a vida de seus entes queridos sem ele.

Já sobre o núcleo da moda, bem destacado na trama de “Um Anjo Caiu do Céu”, e que era encabeçado pela perua tresloucada Laila (Christiane Torloni), Calmon disse ter bebido da fonte dos filmes “Do Mundo Nada se Leva”, de Frank Capra, e “Nas Profundezas do Mar sem Fim”, com a Michelle Pfeiffer.

Como em toda novela, “Um Anjo Caiu do Céu” também teve nomes escalados previamente para o elenco, mas que acabaram ficando de fora da trama. Foi o caso dos atores de Fabio Assunção e Francisco Cuoco. Ambos não participaram da novela, mas tiveram seus nomes ventilados na imprensa.

João Medeiros (Tarcísio Meira) era o grande protagonista da história. Foto: Divulgação

 

A história que foi contada

Coube a Caio Blat dar asas a Rafael, o anjo caído do céu do título, que veio à Terra cuidar do fotógrafo João Medeiros. Logo no inicio, João sofre um atentado e foi salvo pelo seu anjo da guarda, que, em troca de uma segunda chance, impôs ao fotógrafo a remissão dos vacilos cometidos na vida, principalmente, dentro da família. Para correr atrás do prejuízo, foi concedido a João Medeiros mais seis meses de vida.

Um dos trabalhos hercúleos de João,  ao longo dos 185 capítulos da trama, foi  ajudar a vida de Naná (Renata Sorrah), sua ex-mulher e atual parceira do nada confiável Tarso (José Wilker, em ótimo momento da carreira). Para completar sua epopeia, descobriu-se pai de dois filhos: Cuca (Débora Falabella) e Rodrigo (Tarcísio Filho).

Do casamento com Naná, João teve duas filhas: Duda (Patrícia Pillar), a mais velha, era  casada com Maurício (Marcelo Antony), dono da boate LZ-129, um grande point da trama, com cenário marcante. A outra filha era Virgínia (Débora Evelyn), que culpava o pai pelo acidente que a fez ter um problema na perna, na adolescência, e acabou com seu sonho de ser bailarina.

Ainda entre “as mulheres da vida de João Medeiros” havia Laila (Christiane Torloni), ex-modelo que se tornou dona de uma faculdade de moda. Personagem que vivia tentando impor à filha, Cuca, a vida fashionista e fútil que ela levava. Foi um dos personagens mais marcantes da trama.

Deborah Falabella e Henri Castelli em início de carreira como Cuca e Breno. Foto: Divulgação

Paralelo a isso, acompanhamos também  Rafael, o ser celestial, apaixonado por Cuca, a filha de João Medeiros e, em nome do sentimento, chega até a optar por se tornar um mortal. Passou pela experiência, e, entre outras, sentiu dor e a fadiga de uma ressaca daquelas. Não deu outra: o anjo voltou atrás e aceitou sua condição angelical. Assim, Cuca teve seu final feliz com Breno (Henri Castelli).

A parte esfuziante da novela, uma marca das tramas ágeis de Antonio Calmon, ficou por conta dos neonazistas (entre eles, Lenya, melhor momento da Chris Couto nas novelas) que corriam atrás das fotografias tiradas por João Medeiros em Praga, logo no início da trama. Já a comédia estava concentrada nos personagens Selmo de Windsor (Daniel Dantas), um estilista brasileiro decadente que morava em Londres, e Paulinho (Cássio Gabus Mendes), seu copeiro, que aproveita a morte do patrão para se fingir-se de gay e estilista, numa clara homenagem a Cassiano Gabus Mendes e a sua icônica Tititi.

 

Uma (quase) censura em 2001

 Antonio Calmon também contou à imprensa, que esteve em Brasília para uma conversa “informal” com o Ministério da Justiça. Isso pelo fato do órgão ter visto apenas a cena da morte de João Medeiros (Tarcísio Meira), no primeiro capítulo da novela, e passar a acreditar que a novela tinha um “tom” mais adequado para o horário das oito daquela época.

“Achei estranha essa convocação. Mas o papo foi agradável. Disse para eles que estava me sentindo no Irã”, contou em entrevista, às vésperas da estreia da novela.

O imbróglio, entre outros, foi gerado a partir da polêmica portaria nº 796, de 08/09/2000, sobre a classificação indicativa de programas de rádio e televisão, que estipulou horários da programação da TV abera para faixas etárias específicas. Para se ter ideia, naquele período, fundamentado nesta portaria, o Ministério Público do Rio causou um verdadeiro furor na novela “Laços de Família”. O órgão entrou com uma ação na Justiça, obrigando a exibição da novela somente após as 21h.

O autor de “Um Anjo Caiu do Céu”, então, comemorou que o órgão compreendeu o conceito da trama e a novela não precisou passar por um abrandamento de sua narrativa.

“Eles tinham achado o texto violento. Expliquei que só o primeiro capítulo seria assim. Não é de meu estilo fazer coisas agressivas.”

Resolvido o imbróglio, a novela pode ir ao ar na faixa das sete, naquele 22 de janeiro de 2001. E como se sabe, foi um sucesso de crítica, audiência e repercussão. Até hoje, é uma das mais pedidas e lembradas para o Canal Viva e Vale a pena ver de novo. Será que os noveleiros e fãs da novela terão uma reprise nos 20 anos da trama? Ou será preciso pedir uma ajuda celestial para isso? O tempo dirá!

Compartilhar: